Here go again!!! 01 02 03 Segue uma entrevista que a Renata, estudante de Jornalismo fez com este cartunista/chargista. 1. A charge é um gênero opinativo, mas ela expressa a opinião dos veículos e seus interesses ou o chargista possui autonomia? Vocês tem liberdade para criar? Hoje posso dizer que tenho liberdade. Não tenho tido problemas com vetos há muito tempo. No meu caso, pelo menos, a charge não expressa a opinião do jornal, as vezes isso acontece, mas nem sempre. Por incrível que pareça, alcançamos uma certa pluralidade de opiniões dentro das páginas da GP, o que é ideal para um veículo que pretende chegar às mãos do maior número de pessoas. Conheço alguns editores pró-governo e outros contra, e nunca implicaram com o que faço. Discordam em alguns pontos de vista, mas respeitam. Na real, o que as pessoas precisam saber é que o chargista não se importa com legendas ou nomes, mas sim com a ética, a justiça social, honestidade, a liberdade de expressão, a democracia e, acima de tudo, o humor. Valores muito maiores do que os personagens mesquinhos da politicagem do dia-a-dia, ou esses partidos políticos que não representam efetivamente a população, mas sim grupos e interesses econômicos particulares. 2. Como se dá processo de construção das charges da forma como se apresentam (irônica, cômicas e contextualizada). São pautadas/ encomendadas? Surgem da percepção do artista sobre os principais fatos? Não, não são pautadas da mesma forma que um jornalista é pautado, por exemplo. Algumas vezes o editor conversa “olha, essa é uma edição especial sobre as eleições americanas. Que tal se você fizesse alguma coisa sobre o assunto?”. Isso é o máximo que pode acontecer, a busca por um alinhamento de temas. O chargista desenha sobre as principais notícias da semana, para seu trabalho ter algum sentido. Mas isso é o de menos, o mais importante é o chargista ler os fatos além da superfície da notícia. Você falou muito bem em percepção, e é justamente isso que diferencia um bom chargista de um chargista razoável: a percepção do que há por trás da notícia, a capacidade cognitiva de criação do chargista depende de ele queimar fosfato pensando em algo além do senso comum. A charge não pode simplificar tanto a ponto de deixar a discussão rasteira. 3. A migração das charges para a TV e para internet permite que o público tenha uma melhor leitura das charges mesmo sem estar suficientemente informado sobre o assunto do qual elas tratam? Poatz! Honestamente, acho uma merda as charges eletrônicas brasileiras. Elas pasteurizam a contundência da charge e deixam a coisa meio…zorra total. Vi algumas americanas e pareciam menos preocupadas com a audiência da tv, mas eram uma merda também. E, na real, nem é preciso estar muito informado para entender a charge, basta ter “ouvido falar no assunto”, que acho que isso é o máximo que o brasileiro médio se dispõe a assimilar das informações que lhe são vomitadas todos os dias. Penso que, se o cara não entendeu no jornal, vai ficar sem entender na tv ou internet, vai rir do cara caindo de bunda, sabe? Não quero generalizar, mas sei bem que a minha charge –assim como todo o meu trabalho- está restrito a um nicho muito pequeno de uma parcela alfabetizada da população. Na internet as charges revigoraram. Surgiram mais espaços, espaços interativos, mais chargistas, que passaram a trocar informações entre si. E isso revitalizou o espaço dos jornais, que estavam exíguos. Agora estão só um pouco exíguos:>) 4. Como é o seu processo de criação? Gasto umas quatro ou cinco horas no processo todo, de rabiscar no papel as idéias, desenhar, digitalizar, colorir, enviar para o jornal por e-mail. Normalmente desenho duas ou três charges, escolho a melhor e mando, ou mando todas para o editor escolher. Pela manhã leio dois jornais, dou uma olhada nos blogs de notícias, vou verificar se a idéia que tive já não foi feita por outro desenhista. Vou me informando no decorrer da semana para regurgitar a charge no domingo. A verdade é que, depois de tudo isso, fico esgotado. Ainda mais se não consegui pensar numa charge muito boa. 5.Muitas charges geram polêmica por conta de seu conteúdo. Algumas, como aquela famosa do profeta Maomé, repercutiram mundialmente. Quais são os limites éticos do chargista? Até onde ele pode ir nesse aspecto? É…eu jamais desenharia uma charge sobre Maomé, mesmo porque meu pescoço tem alergia a aço e meu organismo costuma rejeitar pólvora. Bem, claro que há limites, tem que ter bom-senso. Mas o humor sempre vai extrapolar esses limites uma hora ou outra, sempre vai acabar soando preconceituoso, ofensivo, agressivo. É foda, vai muito do que o leitor quer enxergar também. 6. Na sua avaliação, a charge é um gênero jornalístico? É, assim como a crônica, o editorial. Ela é uma forma gráfica e satírica de opinar. Ela é ficcional, mas parte de assuntos de nossa realidade. Puramente cômica ou somente crítica. A charge pode não ser engraçada ou muito crítica, mas ela precisa ser inteligente. Essa é a minha opinião, alguns gostam só de piadas, outros só de pancadas… 5. Quais são os maiores desafios profissionais de um cartunista? Acredito que é recuperar um pouco do conteúdo de nosso trabalho, recuperar uma certa imagem construída por caras como o Millôr, o Jaguar. Parece que hoje nos levam menos a sério ainda do que nos anos 70/80. Os cartunistas perderam espaço para os designers gráficos, stand-ups e estilistas, um pouco também porque as pessoas acham que cartum é coisa de velho romântico, saudosista dos anos 60 ou de moleque de boné. O fato é que agora somos nanicos intelectuais, e isso é um pouco reflexo do que as pessoas têm lido nas charges, cartuns e tiras. Não que eu defenda o intelectualismo no cartum/charge, mas eu defendo piadas inteligentes, capazes de escalar e saltar o muro da obviedade, só isso. Muro da obviedade, isso foi tão sublime… 8. Hoje existe mais espaço para as charges nos veículos? Acho que isso depende muito de quais chargistas estão disponíveis, se são adequados para determinado jornal. Há uma valorização da produção gráfica nos jornais, mas tá meio restrito a alguns jornais que conseguem se dar ao luxo de pagar por isso, ou são sérios o suficiente para admitir um humorista entre seus colunistas. Não sou tão bom ou experiente assim para dar conselhos, nem quero soar arrogante, mas acho que hoje o cara deve saber mais do que simplesmente desenhar para fazer charges. Deve compreender o que tá falando. Só chamar um cara de ladrão ou corrupto…bem, temos 200 chargistas que podem fazer isso, e que estão disputando o mesmo espaço em dois ou três jornais. Os jornais encolhem, diminuem a tiragem e o número de chargistas aumenta. A saída é estudar desenho, estudar jornalismo, estudar pintura digital, essas coisas. De forma auto-didata ou não, como em qualquer outra profissão. Ou isso ou o cara vai se foder completamente. 9. Nota-se que muitas pessoas confundem charges com cartuns. Quais são as principais diferenças ente os dois gêneros? Amor é prosa, sexo é poesia e cartum é masturbação. Charge…bem, tive um bloqueio agora, não consegui associar a charge com nada sexual, só me veio à mente o Sarney, o Jader Barbalho, o Marcos Valério, o Bush. Não sei…charge é sadomasoquismo, talvez. Definir charge e cartum…não sei, depende, se você tirar o cartum de náufrago isolado numa página qualquer de uma revista e colocá-lo na página de opinião de um jornal direcionado ao Sindicato dos Náufragos, ele vira uma charge. Mas, bem…eu não sou muito bom em definir essas coisas. O Angeli e o Paixão têm as manhas. O Tiago Recchia também. O Jaguar passou 40 anos respondendo a essa pergunta. Eu não consigo distinguir um chinês de um sul-coreano ou um tutsi de um bantu. Ou um sasquatch de um yeti. Com a charge o cartum é a mesma coisa… Escrito por Alberto Benett às 17h39 [ (5) Vários Comentários ] [ envie esta mensagem ] [ link ] |
13/10/2008 |
É triste dizer isso, mas quanto pior a situação, melhor para o cartunista. Não, não somos bem uns urubus que faturam em cima da crise, mas é que...são mais assuntos, mais possibilidades, coisa nova. Fazer charge sobre eleições pela milésima vez é um saco. Ou festa junina -quem não desenhou as quadrilhas de Brasília?- ou olimpíadas...Deus é bom (Atenção: ative seu decodificador de ironia, please!) volta e meia Ele nos brinda com algum escândalo ou tragédia. Tinha pensado em uma charge com o título "Cow Parade", usando o Bush e aquele touro do Lehman Bros, na Wall Street. Mas como não vou publicar, nem cheguei a desenhar. mais uma só... Escrito por Alberto Benett às 12h57 |
terça-feira, novembro 11, 2008
CHARGES
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